A luta pela conquista do poder, bem como pela sua
manutenção e expansão, fala mais alto. O impulso expansivo e agressivo da
natureza humana está na raiz desse realismo político
Por | Luiz Flávio Gomes - Quinta Feira, 13 de Dezembro
de 2012
Diante de
tanta corrupção no mundo atual (o caso mensalão que o diga) não há como não
aceitar a ideia de que devemos prestar atenção no discurso ético. Mas já não é
suficiente dirigir mensagens exclusivamente à consciência individual. Toda
nossa organização social, econômica e política tem que ser repensada e
reestruturada. A perversão moral generalizada nos estimula a pensar em algo
mais profundo do que melhorar o ser humano isolado.
No mundo da
atual economia globalizada de mercado já se tornou difícil distinguir o que é
ganho lícito do que é ganho ilícito. Tudo está se mimetizando (mesclando). Tudo
que se ganha com o tráfico de drogas, de armas ou de seres humanos se mescla
com ganhos lícitos, o que dificulta sobremaneira a atuação da justiça. Está
fazendo muito falta a exemplaridade, sobretudo dos políticos e das elites
econômicas, que valeria como guia para o comportamento de todos os demais seres
humanos. Na nossa vida pública, quem poderia ser identificado como pessoa
exemplar?
Em tempos de
mensalão, do PT e do PSDB (o primeiro já está sendo julgado pelo STF, enquanto
o segundo aguarda pauta), vale a pena (mais ainda) recordar noções básicas da
política e da Ética. A política está no plano do ser (do que é). A Ética mora
no plano do dever ser (como as coisas deveriam ser). A Ética diz: não se
comprometa com o erro, com o desvio, com o malfeito, com o tratamento desumano
das pessoas. Todos nós, que admiramos a Ética e os valores republicanos,
gostaríamos que a política seguisse os princípios éticos (que houvesse
coerência entre a teoria e a prática). Mas, desgraçadamente, Maquiavel explicou
que (a política) não é assim (em O Príncipe). O traço mais característico da
política consiste na sua radical autonomia frente à ética e à religião. Entre o
"ser" e o "dever ser", o realismo político (Realpolitik)
faz uma clara opção pelo "ser" (pelo que é). Quando coincide a
prática com a Ética, tudo bem. Se não coincide, vale o realismo político
(porque está em jogo o poder, que deve ser conquistado, mantido e expandido). O
exercício do poder, quando não é feito em nome dos interesses da nação, sim,
dos ganhos privados, entra em rota de colisão com a Ética.
Por força dos
princípios éticos e dos valores republicanos o PT não poderia ter comprado
apoio parlamentar de vários partidos nem o PSDB deveria ter feito seu mensalão
em Minas Gerais e muito menos conquistado ilicitamente apoio para a emenda da
reeleição de Fernando Henrique. Por que os políticos fazem isso?
O líder
político, diz Maquiavel, não pode nem deve pautar a sua conduta na condução do
Estado do mesmo modo que um indivíduo orienta sua vida privada. Teoricamente
não deveria ser assim. Mas assim é, na prática. A luta pela conquista do poder
(bem como pela sua manutenção e expansão) fala mais alto. O impulso expansivo e
agressivo da natureza humana está na raiz desse realismo político. Maquiavel,
em 1513, já explicava como tudo isso funciona (na prática). Por isso que ele é
considerado um dos pais da filosofia prática e um dos homens mais sábios de
todos os tempos.
Autor: Luiz Flávio Gomes, 55, doutor em direito penal, fundou a rede de ensino LFG. Foi promotor
de justiça (de 1980 a 1983), juiz (1983 a 1998) e advogado (1999 a 2001).
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